segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Crise dos 40!

09 /10/2010

“Emancipar-se da escravidão mental, que é identificar a própria e particular visão com o infinito abissal do Universo, é um ato de coragem, a negociação de que haja diferença entre o observador e o próprio ato de observar. Ninguém além do próprio humano no mais profundo de sua intimidade pode libertar-se do errado conceito de haver diferenças que o separem ou distanciem da natureza, de seus semelhantes ou dos astros que levitam no céu. Só vive com medo quem leva a sério demais as particularidades que o distanciam do Universo. Superar esse medo é lançar-se de braços abertos à vida, reconhecendo intimamente que tudo é vida, que tudo é da própria natureza da vida e também reconhecer que a necessidade comanda todos os passos.”

Quiroga


Chegamos. Já estamos na ilha. Não tem internet, TV, telefone, nada.

O mar estava bravo, as ondas batiam forte no barco. Vento forte no rosto.
Está frio, mas quero banho de mar e Sofia faz questão.

- Leva Yemanjá, leva embora a inhaca.

Amanhã, aos 40, estarei limpa.

É minha infidelidade no dia 10 com o blog esse sentimento que eu sinto ou eu posso mudar tudo até mesmo a história do crise dos 40? Egoísmo? Egocêntrica? Liberdade.

Estou longe. Na minha última noite dentro dos 30... Meu último dia aos 39.

Ouço as ondas batendo, ouço Chico Buarque.

Foi preciso. Me perdi as vésperas dos meus 40. O tempo dá sustos. O tempo dos outros, mais ainda.
Tive que me procurar. Me achei. Ufa! Me encontrei. Claro, não me achar numa data dessas seria dar a vitória a alguém que desconheço, eu não me reconheceria... Esses 40 me ensinaram... Me ensinaram um outro lado da moeda. O lado da razão. Do anti-sonho. Da verdade nua e crua. De ter a certeza que existe um mundo paralelo, que eu nem conhecia, onde é proibido a paixão. Não existe. Em que o sonho é jogado fora.

E sem sonho, não tem como viver. Não tem como viver meia-hora sem paixão! Não! E onde fica o encanto? Perdi? Não, não... Esse mundo não é meu... Esse mundo é de outra... Talvez de uma pervertida qualquer que só quer gozar, sem sonho...
Achei o desapego no som das ondas... Explodem para o nada, voltam e recomeçam... Tão surdo o desapego, frio... Mas gera liberdade. Que gera a sistemática do estrago.

É quando você não sabe mais o que fazer com aquilo e estraga. Estraga tudo. Fica mais fácil estragar do que ficar com aquela sensação boba nas costas.

Eu virei o estrago? Desviro.

Durmo cedo.

Às 03:00hs da manhã:

Acordo, volto a escrever pra entender melhor tudo. Abro catálogos, vejo obras, penso: - não é possível...

Repenso...

Durmo de novo.

Dia 10/10/2010:

Acordo às 09:00hs, tem sol.

Releio todas as páginas. Releio o jornal, inclusive o Quiroga...

Pego “quase nada, sobre quase tudo”; Jean d’Ormesson, “que é que o sexo tem?”:

“O sexo confunde-se com a vida, com o tempo, com o desejo, com o prazer, com a lei e sua infração, e com o segredo. Desenha o bem e o mal e arrebata-os e mescla na mesma vertigem para além do todo. Diante de santa Tereza pintada em êxtase por Bernini na igreja do parlamento de Dijon, Charles de Bross, exclamou: “Se esse é o amor divino, eu o conheço.”

Senão o desconheço, eu também...

...

“O sexo é todo poderoso quando manifesto e talvez ainda mais poderoso quando oculto nos outros e de si mesmo, e quando subterraneamente aflige espíritos e corpos. O sexo tem seus heróis, suas vítimas, seus artistas, seus delinqüentes, seu cinema, suas listas negras, suas estampas, e seus instrumentos, seu índex e seu inferno. É capaz em transformar em sonhos, em crimes, em sofrimento, em loucura, em linguagem, em obras de arte, em trocadilhos e em divã, em lembrança e em esquecimento, em espírito de conquista ou em aparência de santidade. Em dinheiro, também. E em exploração. Especializada ou não, a literatura está repleta dessas metamorfoses. Ele é capaz inclusive de mudar-se em amor.”

O Casal Garcia Verde roda gelado em mim...

“E um instante de anseio de felicidade
Vale mais que a tão fria e vã eternidade.

...

E no entanto, que mais? De que mais, digam-me, por favor, verdadeiramente vocês tem desejo? De casas, jóias, carros, poder sobre os outros, senão o pouco de amor que súbito a vem inflamar?”

Baudelaire:
“Mãe das recordações, rainha das amantes,
Ó tu, todo meu gozo! Todo o meu dever!
Tu te recordarás das carícias flamantes,
Da lareira a doçura, da noite o prazer.
Mãe das recordações, rainha das amantes.”

O milagre brota do cotidiano...
A paixão é o que homem tem de mais íntimo.
E é ela, todavia, que com a maior brutalidade o faz sair de si.
O que move o homem, o que o faz agir e tentar mudar o mundo, não é o pensamento, a razão, a dúvida ou o sentimento – é a paixão.

Todos procuram a felicidade, e a infelicidade muito amiúde faz parte da felicidade. A grandeza da paixão, que transtorna tudo à sua passagem, reside em dar as costas à felicidade. Exalta a quem ela própria fere, inebria-o, enlouquece-o, e a nosso pedido instante, para mais nos aprazer, por expressa ordem nossa, destrói-nos.

“Óh alma minha, não aspire à vida imortal, mas esgote o campo do possível.” (Píndaro)

Onde está a minha inspiração?
Eu não vivo sem paixão.
Esse poderia ser o ponto final dos meus 40, mas não, é apenas o ponto de partida.
Estou pronta.